MUNDO MAU: SOMOS VÍTIMAS OU CULPADOS?

30/01/2014 10:09

* Por Jacira Baia


Hoje, diante do terror que vagueia pelas ruas, em forma de vultos sombrios a nos aguardar nas esquinas, temos medo de sair de casa, nos aprisionamos entre nossas próprias grades, dentro de nossos próprios medos. A vida lá fora está deixando de ser vivida para ser projetada apenas nas telas da televisão e/ou do computador. 

Criticamos os governos, queremos mais policiais, mais presídios, penas mais rígidas, redução da maioridade penal, enfim, queremos o fim da violência, pois não aguentamos mais tantos assaltos, furtos, homicídios, estupros... Queremos curar um sintoma sem dar importância à causa de sua propagação.

Por onde quer que passemos, vemos o reflexo das injustiças sociais, da má gestão, da irresponsabilidade dos homens públicos, que implica a precariedade da educação, o desemprego e consequentemente a miséria tão crescente neste país. E nos revoltamos com tanta falta de caráter, com tanta falta de respeito para com o povo, a ponto de pintarmos as caras, irmos para as ruas, gritarmos bem alto a fim de que sejamos ouvidos por aqueles que governam, que ditam as regras, que fazem as leis, as quais deveriam promover a “ordem e progresso” aos brasileiros. 

Chega o momento em que a espera se torna um fado pesado, uma ansiedade que rompe o último fio da tolerância, e o expectador passa a querer protagonizar a história. Então, levantam-se do meio do povo homens e mulheres para defenderem os interesses do povo, cujo meio de agir com mais força é fazendo parte dos grupos de capitães que comandam a grande máquina do poder. Mas para tanto, tem que se vencer uma maratona, num percurso muito acidentado, em que disputam milhares de atletas, sendo a maioria deles desleais, “treinados” nas trapaças, na leviandade. Nessa maratona está também a prova de persuasão: é preciso convencer o povo de que político comprador de votos não é sinônimo de político honesto. Mas como explicar isso numa sociedade assolada pelo desemprego? Como fazer uma família pensar em melhoria a longo prazo, se as crianças pedem pão para matar sua fome no agora?

Mesmo assim, vamos à luta, proferimos nossos discursos nos palanques em alta voz e ecoamos o grito do povo, de tal forma que este, muitas vezes, acaba nos colocando onde deveria ser o lugar de seus representantes de fato e de direito. Vencemos a maratona. Entretanto, como tem acontecido nos contextos da política, chegamos lá e não conseguimos nos imunizar contra o vírus que infecta os grandes gabinetes: a corrupção. Então, nos igualamos ou até nos tornamos piores do que aqueles que lá estiveram e nada fizeram em prol do bem estar social. Acabamos por fracassar enquanto representantes do povo.

E quanto ao povo? Somos seres inteligentes, uns com uma visão mais ampla do que outros, temos capacidade de percepção, de criticidade, e temos o poder nas mãos para escolher nossos representantes, aqueles que vão defender os interesses do povo frente às esferas do poder. Mas na hora de escolher, algo acontece... Esquecemos a coletividade e pensamos no próprio umbigo, sem nos dar conta que nossas escolhas, se erradas, serão prejudiciais a toda a sociedade, da qual fazemos parte, e seremos afetados pelas consequências da má administração, pois casas luxuosas, carros, motos e cargos importantes não blindam nossos corpos, não protegem nossos filhos dos laços da maldade.

Além do papel que exercemos na relação povo e governo, como anda nossas responsabilidades enquanto pais? 

Alguns de nós, mal o filho aprende a falar e já balbucia palavrões, e achamos isso engraçado. Quando chegam da escola, reclamando de um coleguinha ter lhe dado um empurrão, é comum os incentivamos a dar um soco na cara de quem os importunar. Crianças ditam as regras da casa e não aprendem a respeitar limites porque não os ensinamos a elas. Muitos filhos menores de idade estão nas ruas, nas baladas e até compartilhando um copo de cerveja com seus pais e achamos isso natural. Nossas filhas, ainda crianças, usando salto e maquiagem, empinando o bumbum para dançar músicas de letras obscenas e achamos o máximo! E ainda contamos com orgulho aos nossos amigos.

Por fim, muitos de nós passamos horas ocupados com o trabalho, ou na frente do computador ou da televisão, ligados nos BBBs da vida, bisbilhotando a vida alheia, e não encontramos tempo para estreitar os laços afetivos com nossos filhos, conversar sobre seus problemas, seus objetivos, suas conquistas, dar a eles e às outras crianças exemplos de princípios de humanidade, e por isso nem percebemos o tipo de adulto que vão se tornando, bem à frente de nossos olhos, deixando-os a mercê do grande fenômeno alienante e obstrutivo do pensamento: as influências midiáticas. Acabamos perdendo a oportunidade de ajudar a formar os tipos de personalidades que construiriam, no futuro, o mundo com o qual hoje sonhamos.

* Jacira Baia é Professora licenciada em Letras pela Universidade Federal do Pará - UFPA

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